A 6ª edição do CURA -Circuito Urbano de Arte está acontecendo na Praça Raul Soares, no coração de Belo Horizonte. O novo território abriga também o maior monumento modernista de Minas Gerais: o edifício JK. Projetado em 1952 por Oscar Niemeyer, é composto por área comercial e duas grandes torres residenciais, que se destacam na paisagem da capital mineira. No próximo sábado (23/10), às 19h, essa imagem se tornará ainda mais icônica. Uma das fachadas do edifício receberá uma intervenção em forma de projeção pelo Coletivo JK. Uma obra do artista Eder Santos, parte da programação do CURA.
A projeção relembra a forma como a Raul Soares foi e é um espaço em disputa, que hoje se estabeleceu como um importante território de convivência LGBTQIA+. Uma história que deve ser contada, pois é necessário lembrar do combativo passado de uma militância que não se deixou abater pelo preconceito.
A projeção
A projeção, que será dirigida pelo videoartista Eder Santos e seu sócio, Barão Fonseca, sobrepõe as representações negativas das pessoas LGBTQIA+ a fotografias de mulheres trans e travestis, que, orgulhosas de ser quem são, posaram para as lentes do fotógrafo Lucas Ávila ou se autorregistraram, como no caso de fotografias do acervo da militante Anyky Lima, uma das principais vozes da militância travesti e transexual em Minas Gerais que morreu em março deste ano e que agora será merecidamente homenageada. “Anyky sobreviveu a violência da família, sobreviveu a violência do estado. Lutou pelos direitos das pessoas trans, para as pessoas serem quem elas querem ser. Merece sempre ser lembrada”, avalia o artista.
Assim como Anyky, todas as outras pessoas fotografadas representam ou são descendentes do ancestral ativismo por reconhecimento da própria identidade, sendo entidades da comunidade queer belo-horizontina.
Já as reportagens de época, que evidenciam uma realidade de repressão contra LGBTQIA+, são parte da pesquisa de Luiz Morando.
Para Lorena Maria, do Transpasse, a projeção no icônico edifício JK fala da história LGBTQI+ em BH. “Quando era bem novinha e havia recém-chegado a Belo Horizonte, morei no JK. O prédio é um ponto de referência, com os barzinhos próximos e a própria praça. Tem tudo a ver com a comunidade trans, com a comunidade LGBT em geral. É um ponto de encontro”, diz Lorena.
Além dos retratos e reportagens, a projeção usa cenas do videoclipe “Duas Pessoas”, de Aldrin Gandra e dirigido por Barão Fonseca, e de uma batalha de Vogue gravada em 2018 na boate Matriz, no edifício JK. As imagens foram cedidas pelo cineasta Leonardo Barcelos e compõe o material do filme “Corpo Presente”, que deve ser lançado em 2023.
Tais escolhas não ocorrem ao acaso: ambas as gravações são alegóricas da mudança da maneira como as pessoas LGBTQIA+ são representadas. O Vogue, por exemplo, é um estilo de dança pautado por performances que, entre outras coisas, comunicam o orgulho queer.
A modalidade surgiu em Harlen, em Nova Iorque, e, no Brasil, fez de BH sua capital. O Trio Lipstick recebeu a notícia da ação com entusiasmo. “É uma cultura super potente, que foi só crescendo até chegar no que é hoje. Belo Horizonte é considerada a capital do Vogue no Brasil”, diz Tetê Moreira, bailarina do trio e uma das criadoras do festival BH Vogue Fever, que acontece em BH no mesmo final de semana da projeção.
Todos os trechos de reportagens e manchetes e as fotografias de mulheres trans e travestis se referem a eventos que ocorreram na Raul Soares ou em suas imediações.
O trabalho de design será feito pelo artista gráfico Fred Birchal, apaixonado por arquitetura e urbanismo, morador do JK desde 2019.
Viva JK: O Coletivo Viva JK é formado por moradores e amigos do Conjunto Governador Kubitschek, o maior monumento modernista de Minas Gerais. Formado em 2019, o coletivo se propõe a conectar as pessoas ao Edifício JK para juntos, construirmos um patrimônio vivo, harmônico e plural.
Ficha técnica
Direção – Éder Santos e Barão Fonseca
Diagramação – Fred Birchal
Grafismos – Alexande Perocco
Argumento e produção – Coletivo Viva JK
Imagens gentilmente cedidas por: Barão Fonseca, CURA, Leonardo Barcelos, Lucas Ávila, Luis Morando, Trem Chic Vídeo
Agradecimentos: On Projeções, Gildo, Sheila
SERVIÇO:
O que: Viva JK projeta um vráááá na Raulzona
Quando: Sábado, 23 de outubro de 2021, às 19h.
Onde: na empena da torre B do edifício JK, e nas redes sociais do Viva JK e do CURA.
Quanto: gratuito.
Sobre o território
A praça Raul Soares e região adjacente é, hoje, reconhecidamente um importante espaço de convivência e sociabilidade da população LGBTQIA+ em Belo Horizonte. Mas nem sempre foi assim.
“Ao longo da década de 1950, esse foi um lugar em intensa disputa, sendo frequentado pela elite que vivia na capital e torcia o nariz para aqueles que eram chamados na época de invertidos e de anormais, que começaram a frequentar esse espaço. Para expulsar esse grupo, há relatos de diversas operações policiais de caráter higienista, estendendo-se aos anos 1960. Nesses documentos, as pessoas LGBTQIA+ são representadas como ameaça à cidade, postas ao lado de criminosos”, explica o pesquisador Luiz Morando, autor do livro “Enverga, mas não quebra: Cintura Fina em Belo Horizonte”.
Contudo, apesar dos esforços no sentido de expulsar dali os que eram lidos socialmente como indesejados e perigosos, não houve política de repressão que impedisse que a Raul Soares fosse sendo paulatinamente ocupada pela comunidade queer que vive na capital mineira.
Com o passar dos anos, a partir dos movimentos de luta por reconhecimento e por direitos, que tiveram por consequência o avançar das pautas de gênero e sexualidade, as pessoas LGBTQIA+ não só fincaram raízes na Raul Soares e região adjacente como também se viu empoderada.
Logo, no lugar de uma representação negativa, as identidades contidas na sigla passaram a dizer de si com orgulho – em oposição à forma como essas pessoas eram apresentadas na maioria dos artigos e notícias até meados do final do século XX.
Sobre o Cura
O Circuito Urbano de Arte realizou sua quinta edição em 2020, completando 18 obras de arte em fachadas e empenas, sendo 14 na região do hipercentro da capital mineira e quatro na região da Lagoinha, formando, assim, a maior coleção de arte mural em grande escala já feita por um único festival brasileiro.
Idealizado por Janaina Macruz, Juliana Flores e Prisicila Amoni, o CURA também presenteou BH com o primeiro e, até então único, Mirante de Arte Urbana do mundo. Todas as pinturas podem ser contempladas da Rua Sapucaí.
Serviço
CURA – Circuito Urbano de Arte, 6ª edição
Início: 21 de outubro de 2021
Local: Praça Raul Soares
https://www.instagram.com/cura.art
PATROCÍNIO MASTER:
Becks ( Lei Estadual de Incentivo à Cultura)
PATROCÍNIO:
Cemig – Governo de Minas
Localiza
Lei Municipal de Incentivo à Cultura
APOIO:
Coral
Planalto Tintas
APOIO INSTITUCIONAL
Belotur e Prefeitura de Belo Horizonte
REALIZAÇÃO:
Pública Agência de Arte
-Renata Alves-
Comunicação
1a Foto: Intervenção Coletivo Viva JK – Foto: Lucas Ávila
2a Foto: Anyky Lima – Foto: Arquivo Pessoal
3a Foto: Lucas Ávila
@ Portal AL 2.0.2.1