Ele é o que podemos chamar de um profissional completo dos pick-ups. Curador, produtor musical, colunista e professor da arte DJ são alguns dos seus atributos. Forjado no calor dos bailes de subúrbio dos anos 1990, Walnir Cunha, mais conhecido pelo nome artístico “DJ Bon.Enecko“, coleciona em seu precioso currículo participações notáveis em aberturas de shows de nomes importantes da cena musical como Gilberto Gil, O Rappa, Marcelo D2, Afroreggae, Carlos Dafé, Silvera, Gabriel O Pensador, Bebeto e Racionais MC’s, além de residências por casas noturnas de referência como a recém-extinta CLUB SIX, localizada no boêmio bairro da Lapa, sobre a qual durante o início dos anos 2000 teve a honra de dividir a cabine com os DJs “Saddam” e “Juan Melo”; no mesmo período em que também fundou a “Do Lado de Cá Produções”, responsável pelo lançamento no ano de 2005 do vinil “DJ Boneco Convida” – creditado como a primeira compilação de RAP independente produzida por um DJ Carioca. Como escritor, DJ Bon.Ecko lança HOJE (09/03/18) seu primeiro livro – “DJ Quem São Vocês?” – em data e evento extremamente sugestivos: na celebração do DIA MUNDIAL DO DJ no RIO DJ MEET, uma iniciativa do próprio Bon.Ecko, ao lado do amigo “DJ João Suprani” e as parcerias da “Secretaria Municipal de Cultura”, “DISCOTERJ – Associação dos DJs e VJs do Estado do Rio de Janeiroe” e a “Rebuliço – Agência Cultural”, que busca valorizar e estimular a profissionalização da cena carioca de DJs e produtores de música eletrônica. Conheça agora uma pouco mais dessa personalidade marcante da Noite Carioca, que trata a cena DJ do Rio de Janeiro como parte preponderante da Cultura do nosso e estado…
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Entrevista:
ZULU – Uma pergunta que nunca pode faltar: Como se deu o seu despertar como DJ?
DJ BON.ECKO – Foi um processo natural, muitos jovens na época tinham muitas referências musicais, MTV, programas de rádio, discos, entre outras coisas; mas naturalmente, tive uma inclinação para querer tocar e me aprofundar neste universo.
ZULU – Você trabalhou como DJ residente de várias casas noturnas cariocas entre os anos 1990 e o início dos anos 2000. Como você interpreta a cena atual de DJs no quesito evolução?
DJ BON.ECKO – Evoluiu para quem quis evoluir, é fato! No cenário diríamos eletrônico, eles trabalham a imagem do DJ de uma forma absurda, fora alguns eventos com pirotecnia, estruturas “animais” e isto é um plus para o DJ. Tem muito investimento. Mas antes, para estar lá, teoricamente tem alguns bons mandamentos para o DJ preencher. No circuito Black é mais aberto, acho que a chegada de novos gêneros, muito disto com advento do “Trap”, está dando uma nova cara para estes bailes. Ficou mais aberto. O próprio “Funk Carioca” chega a rolar em muitos destes, bem como o “Afro House”, coisas latinas e, tem muita coisa nacional sendo feita também. O público está mais aberto. Também observo evolução. Porém, sei que existem vários níveis de ascensão e para alguns, muito do que é reclamado, não reflete a atual realidade de um DJ, que está incluso num mercado que se auto sustenta, que é planejado e que não cabem certos preceitos que muitos ainda insistem em não absorver.
Não sei se me farei entender, mas vamos lá. Analise, ou seja, qual nicho eu atuo? Ele é um nicho mesmo? Qual tamanho dele? Eu me dou oportunidade? Me trato como empresa ou acho que isso é uma grande bobeira e que ninguém liga?
Se tivermos uma certa lucidez, talvez possamos vir a falar de mercado. Resumo, busca por informação e estudo (que não se resume somente ao que você vai tocar naquela noite), Isto é evolução. Antes, muitos de nós nem sabíamos o que tocávamos, sabíamos que era bom e tínhamos os discos. Hoje, continuamos tendo muitas músicas boas. Tenho vontade de tocar tudo: Sinthpop, RAP, Reggae, etc… Por outro lado, tocar a infinita maioria destas descobertas, dependendo de onde você estiver, ficou mais complicado, ou seja, tem que pesquisar bem.
Penso muito na “saúde musical.”
Sei que cada pessoa tem seu nicho de mercado, mas com essa massificação num geral, ainda me cerco com muitas indagações. Vejo algumas músicas fazendo muitos de massas de manobra. Reclamo do político, do jeitinho brasileiro, do cara que joga lixo no chão, mas a minha ferramenta de trabalho que é a música, esta pode ofender, afinal é só uma festa e o povo quer ser feliz.
As músicas não têm seu papel, ela representa o quê? Me emocionei com a comoção que o “Z-Trip” causou aos soldados em pleno Kuwait. Aquilo diz algo, não poderia ser qualquer um ali. É necessário termos mais espaço para este perfil tanto de DJ, como público. Mas e aí, o dono de um club vai arriscar? O problema a meu ver vem de cima, é uma luta injusta. Daí, temos muita pose de coisas que não dizem nada. Muitas coisas que antes eram acessíveis em certas regiões, hoje nem existem mais. As poucas casas que tem, estão aí se localizam em outra parte da cidade.
Atualmente é o seguinte: quer fazer carreira? Identidade, mas do que nunca. Os irmãos que entenderam isso, ainda mesmo no final dos anos 90, muitos conseguiram escapar do que vemos hoje por aí, nesse aspecto negativo.
ZULU – Por falar em evolução, você ministra um Curso de Formação de DJs pelo SENAC. Fale um pouco a respeito.
DJ BON.ECKO – O primeiro momento é dar uma situada, e mostrar diversas referências. Daí, passo informações históricas, valores pessoais, atitudes DJs, etc. Hoje, temos acesso a um vasto material.
Na parte prática, trabalhamos os ouvidos sim e, com diversos gêneros musicais. Chegamos até mixagens avançadas. Mas o que sempre ratifico, é o que chamo da “aura do DJ”. A técnica, você pode até demorar para aprender, mas o seu comportamento perante à sua proposta e aos outros, se não tiver ressonância, isto acaba se tornando bem nocivo. Não penso no aluno como um momento, e sim carreira, e aí vai de cada um. Hoje, os exemplos estão aí para serem observados.
ZULU – DJ que é DJ tem que fazer “Scratch”?
DJ BON.ECKO – Não, embora seja um artifício poderoso, se bem usado.
ZULU – Como foi a ideia de produzir um livro falando sobre essa cena no Rio de Janeiro?!
DJ BON.ECKO – Isto é um perfil pessoal e tem um contexto. Quando fazia meu segundo grau, havia amigos que queriam entrar para o crime, logo eu gravava diversas fitas de RAP Nacional e as distribuía para tentar clarear a mente dos irmãos. Tudo o que eu via ou que me ajudava na minha formação humana, eu sempre quis reverberar. Até então, usava a música como ferramenta. E foi assim que o meu disco surgiu. Pois foi a partir da falta de representatividade, que eu observei o quanto a cena que eu atuava cresceu. E eu sentia falta de uma representatividade de valores e coisas artísticas nossas.
Em seguida, “Don Filó” [considerado como um dos expoentes do Movimento Black Rio dos anos 1970] me convidou para ser colunista da LUB [extinta “Liga Urbana de Basquete”, formada por jovens oriundos das Favelas do Rio, organizada por Filó, com a intenção de resgatá-los socialmente através do esporte e com apoio do HIP-HOP], porque descobriu-se vários nomes que estavam surgindo pelo Brasil e queria divulgar estes sons. Isto é uma inclinação de DJ mesmo, só que fora das cabines.
Sobre o livro, vi muitos valores se perdendo referentes aos DJs, e certas coisas iam muito de encontro ao que me inspirou a ser um também, e isto me incomodava. Daí, despretensiosamente, comecei a escrever; mas dando um objetivo, pois temos uma história, um fundamento.
Hoje, muitos acham isso “papo de romântico”, devido à atual conjuntura, ainda mais nos circuitos populares. Mas se reparamos isso melhor, tudo é uma questão de carência, de perda e aí a questão para muitos é sobreviver. Isso vem de cima, você compactua, indaga, aceita, se sente confortável ou não. Aí é com cada um, sem julgamentos (risos).
ZULU – Existe a pretensão de um segundo volume após esse?!
DJ BON.ECKO – Sim, e talvez não seja livro somente, mas ainda é cedo.
Para entendermos: a história como temos no livro, é a continuação daquela ação que eu fazia quando gravava fitas de RAP. Ou seja, é necessário um entendimento de quem nós somos, o que fazemos para contribuir, em qual terreno pisamos e elucidar que este terreno foi construído por diversos nomes, ou seja, o livro é uma ancoragem. Respeito e reconhecimento. Essa é a primeira parte. Existe um objetivo maior e a outra inciativa para conduzirmos a essa ideia é o “Rio DJ Meet”, que eu e o “DJ João Suprani” criamos. Ali começa o outro passo. No Rio DJ Meet, estou trazendo uma galera e quero que eles se sintam representados em um ambiente plural, ou seja, não é só um livro de história e um evento de encontro de DJs. Existem outros valores.
ZULU – Qual o conselho que você daria ao jovem que almeja seguir a carreira de DJ?
DJ BON.ECKO – Invista em informação.Pesquise o nicho que você tem afinidade. Por que você quer isso? Você gosta de coisas populares ou tem outras cenas que te atraem? Qual sua proposta? Tenha um mínimo de posicionamento e apresentação. Não se iluda que a tecnologia irá fazer tudo para você, ainda tem muita coisa humana a ser aplicada junta aos equipamentos.
Vale a pena ver de novo: RAKIM desabafa em seu Twitter sua preocupação com a Cena do RAP atual
Saiba mais:
O que: Rio DJ Meet no Dia Mundial do DJ
“Lançamento do Livro DJs Quem São Vocês?”
Quando: Sexta, 9 de março de 2018
Horário: 13h-19h
Onde: Memorial Municipal Getúlio Vargas – Praça Luís, S/N – Glória / RJ
Ingressos: Evento gratuito (1 Kg de alimento não perecível)
Realização: Rio DJ Meet
“Classificação Livre”
Evento no Facebook: https://www.facebook.com/events/20
Clica no play para ver!
Por: DJ “Zulu” TR.
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