CONSULTORA PARA ACESSIBILIDADE E INCLUSÃO EM TEATRO, CRIS MUÑOZ, ALERTA PARA A IMPORTÂNCIA DA AMPLIAÇÃO DO TEMA NOS EQUIPAMENTOS CULTURAIS DA CIDADE
Cris e filha possuem Transtorno de Espectro Autista (TEA)
Em 18 de junho é comemorado o dia mundial do orgulho autista. Mesmo com os avanços na legislação brasileira, ainda há muito o que fazer. Levar esta questão ao meio artístico é fundamental para ampliar o tema e acessibilidade nos equipamentos culturais, mostrando ao público que ser diferente é normal.
Os diretores de teatro Gustavo Bicalho e Henrique Gonçalves, do Rio de Janeiro, comandam, há 28 anos, a renomada e premiada Artesanal Cia. de Teatro e comemoram o sucesso de público da peça Azul no CCBB Rio – com lotação esgotada aos sábados e domingos, desde a estreia no dia 3 de maio. Com uma dezena de trabalhos destinados ao público infantojuvenil, e sempre com algo a mais a dizer, desta vez, o novo espetáculo vai de encontro às diferenças: trata do seio familiar e das dificuldades em lidar com uma criança especial com TEA (Transtorno do Espectro Autista). Para contar a história de forma assertiva, os artistas tiveram uma ajuda especial de Cris Muñoz, atriz, palhaça, pesquisadora e professora, que prestou consultoria para acessibilidade e inclusão. Esta peça é um início para se colocar em prática um trabalho visando amenizar a vida de quem se vê em situações com pequenos neuroatípicos, com Transtorno de Espectro Autista, dentro de espaços destinados à cultura.
O processo, em si, é bem tranquilo e não exige grandes adaptações e sim alguns pequenos ajustes e um cuidado maior para tratar do assunto. E isso é importante para que todo espetáculo, adulto ou infantil, seja ainda mais inclusivo. “Penso que existe um movimento ainda tímido no sentido de avançar para uma acessibilidade plena, mas só isso já é um passo enorme. Com certeza está bem no início e tem muita coisa para melhorar que passa por todas as instâncias da cultura: legislação, editais, repasse de verbas, esclarecimento e capacitação de profissionais da cultura com relação à questão da acessibilidade e finalmente medidas concretas que viabilizem a participação de todes na vida cidadã, o que inclui a possibilidade de participar da experiência cultural. Quantas pessoas autistas e com deficiência você vê nas salas de espetáculo, cinema, shows?”, avalia Cris.
“Nossa aproximação com a Cris Muñoz se deveu ao fato dela ser uma atriz, com conhecimento técnico na linguagem que usamos em AZUL e ser uma pessoa inserida no espectro, também mãe de uma menina autista. Era muito importante, para nós, saber se o espetáculo estava correto na sua abordagem sobre o autismo, uma vez que um dos personagens é uma criança com TEA” , observa Gustavo Bicalho.
Apesar dessa peça não lidar de forma tão direta com o tema da neurodiversidade, pode atrair pessoas neuroatípicas, por retratar uma criança com TEA, o personagem Azul. “Eu já havia estudado muito sobre o tema e a Andrea Batitucci, que trabalhou a ideia e o texto comigo, teve uma enteada também autista. O texto surgiu de uma combinação de informações técnicas com experiências vividas pela Andrea”, diz o diretor. A narrativa é transmitida através dos olhos de Violeta, uma menina de quatro anos, que está ansiosa pela chegada de seu irmãozinho, Azul. O que ela não imagina, é que ele acabará ocupando um espaço inesperado na vida da família. Entre os ciúmes e a aceitação de um irmão tão diferente, Violeta descobre que é preciso aprender a lidar com o que a vida propõe para a solução natural dos conflitos. Afinal, o amor entre os irmãos é maior do que qualquer diferença que possa existir entre eles.
Cris ajudou os diretores Gustavo Bicalho e Henrique Gonçalves a quebrarem muitos estereótipos que existem, até mesmo, em livros escritos por terapeutas ou pais de autista, já que o transtorno gera um aprendizado constante. Segundo a consultora, é fundamental entender que cada pessoa com TEA é diferente e reage de formas diferentes aos estímulos do mundo “concreto”. Por isso, algumas mudanças ocorreram, mas de forma natural, trazendo informações mais atuais para o texto, que começou a ser desenvolvido há três anos.
“A gente geralmente começa a pensar nisso quando precisa ou tem alguém próximo que necessita de acessibilidade. Eu sou uma pessoa com tripla excepcionalidade: autismo de nível um de suporte, TDAH e AD/SD ( Altas Habilidades e Superdotação), muitas coisas poderiam ter sido mais fáceis para mim se houvesse acessibilidade e inclusão em todos os âmbitos da vida cidadã: Educação, Saúde, Cultura…Meu diagnóstico foi tardio, já adulta. Mas quando minha mãe tornou-se cadeirante, devido ao Mal de Alzheimer, comecei a reparar como simplesmente a exclusão estrutural e o capacitismo estão em tudo na sociedade. Existem formas concretas e outras sutis de dizer que uma pessoa não é bem- vinda nos lugares” , finaliza Cris.
Qual foi o processo da consultoria para o resultado final?
O processo começou com a leitura do texto, que foi feito de forma remota, com toda a equipe. “Após a leitura, abrimos espaço para que cada um colocasse suas dúvidas, contasse suas experiências, etc. Em seguida, tanto eu quanto a Andrea trabalhamos no texto, buscando trazer esse olhar mais atual sobre o tema, que veio de uma pessoa neuroatípica”, observa Gustavo.
Durante os ensaios, Cris também participou, observando determinados comportamentos que são atribuídos ao Azul (que é o personagem autista). A maior questão estava em adaptar os movimentos do boneco, de forma que ele conseguisse traduzir as estereotipias comumente encontradas nas pessoas com TEA. “E também conversamos um pouco sobre outras questões técnicas, como a luz, o som do espetáculo, as movimentações de cena, de forma a minimizar o risco de causar uma crise de ansiedade em alguma pessoa autista na plateia”, completa o diretor.
Azul está em cartaz em longa temporada, até 6 de agosto, no Teatro III do CCBB Rio de Janeiro, sábados e domingos às 16h.
Assessoria de imprensa -Alexandre Aquino e Cláudia Tisato-
Elenco com Cris Muñoz e a filha Sophia – Foto de Capa: Henrique Gonçalves
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